Sentidos da vida

Várias pessoas me perguntaram se eu estava ansioso para voltar ao trabalho depois de tanto tempo afastado para o tratamento do câncer. Minha resposta para algumas delas foi: “Empolgado eu estava para voltar à academia, não ao trabalho”. Apesar de entender o significado que era retomar o trabalho como mais um sinal de que estava no caminho da cura eu não via ele como o marco mais importante ou empolgante. Demorei uns dias para entender, que não é por não gostar do meu trabalho, aliás pelo contrário. Foi muito bom retomar minhas atividades, reencontrar um número enorme de pessoas queridas, estar envolvidos em decisões importantes da empresa, gosto muito do que faço, mas entendi que o problema era o tempo envolvido nisso.

Durante todo o tratamento me senti super produtivo. Fui atrás de coisas que me preenchessem e me realizassem. Li inúmeros livros, fiz diversos cursos on-line, me dediquei a algumas atividades do meu hostel, me descobri escrevendo e abri a minha mente para assuntos que eu nunca tinha parado para pensar, como meditação e mindfulness. Tive tempo para pensar na minha vida, refletir sobre decisões e viver o presente. Quando voltei ao trabalho não parei de me questionar onde estava aquele tempo que eu tinha para poder desenvolver pensamentos diferentes, para conseguir avaliar o que estava acontecendo.

Agora quando eu acordo já está tudo definido, uma rotina seguida de atividades que não deixam muito espaço para pensar, a rotina já está decidida. Se eu para pensar eu já estarei atrasado para alguma coisa. E quando sobra um pouquinho de tempo no final do dia, falta energia, é uma vontade enorme de se desconectar.  Se desconectar é relaxante, mas tem um preço caro, perdermos a conexão com nós mesmos.

O problema do trabalho é que ele exige um relacionamento baseado na exclusividade, o seu tempo é dedicado a ele. Você passa muito mais tempo no trabalho do que convivendo com a pessoa que você prometeu passar o resto da vida junto. E olha que para achar essa pessoa não foi fácil, deu muito trabalho, demandou muita energia e esforço de negociação e comprometimento dos dois para tornar aquela relação boa para ambos, e tomara que seja pro resto da vida porque assim velhinhos vocês poderão ficar juntos, ou nas férias se conseguirmos tirar no mesmo período. Mas a convivência com a família é só mais um dos pontos que me dei conta que perdem espaço nesta minha nova rotina, e na rotina de todo mundo.

O problema é que à medida que o tempo dedicado à vida corporativa passa a ser tão grande a expectativa de retorno é imensa. Acabamos projetando na vida profissional todas as realizações que poderiam ser supridas por outras coisas, mas que não temos tempo e energia para focar.

Voltei achando que ia ser diferente, mas a diferença foi a minha necessidade de não entrar no ciclo de novo, de manter uma visão crítica permanente sobre a minha vida. Muitas pessoas falam que a gente acostuma com o tempo, todos nós nos acostumamos, mas eu não quero perder essa inquietação.  Não sei se acharei uma resposta para estas dúvidas ou um caminho diferente, mas só de me questionar e não aceitar as coisas porque são assim já acho que valeu o aprendizado.

A questão não é qual o sentindo da vida, mas quantos sentidos você dará a sua vida”  – Nietzsche

PS: a foto deste post foi tirada as 17:40 de dentro do escritório. Este lindo pôr do sol (que a foto não consegue representar) gerou uma confusão no trabalho, uma quantidade enorme de pessoas indo para a janela apreciar por dois minutos uma coisa que perdemos todo dia.

 

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